Vida de Ozanam (IV)
A Primeira Sessão
Assentados os fundamentos da
nova empresa, realizou-se imediatamente a primeira sessão, presidida por
Bailly, provavelmente a 23 de Abril de 1833, após invocação ao Espírito Santo,
e leitura piedosa, extraída da “Imitação de Cristo”. Adoptou-se, então, como
obra fundamental a visita a famílias pobres nos domicílios, não devendo os socorros
ser dados em dinheiro, mas em “vales” para desconto em determinados
fornecedores. Esse plano vem sendo reproduzido até hoje, ainda que com
modificações.
Aceito o programa
estabelecido, cumpria encarar seu desempenho, a começar pelas reuniões e pela
obtenção dos indispensáveis recursos. Estabeleceram-se sessões semanais, contribuindo
cada membro com o que pudesse, sem que um soubesse a quantia dada pelo outro.
Porque, afinal, o objectivo da obra, conforme Bailly, era menos de beneficência
do que de moralização e de confraternização, tendo em vista os pobres e os que
iam assisti-los. São Vicente de Paulo foi designado como protector.
Estabelecido que os socorros
às famílias assistidas seriam em “vales”, surgiram dois problemas: como
escolher essas famílias e como organizar a respectiva assistência. Reconhecendo
sua inexperiência no caso lembraram-se de recorrer à célebre Irmã Rosalie,
Filha da Caridade, Congregação fundada por São Vicente de Paulo, e que presidia
uma organização de assistência à pobreza no bairro de Mouffetard, podendo-se
conseguir dela uma lista de famílias necessitando de receber auxílios.
Apoio das
Filhas da Caridade
Acontecia que Jules Devaux,
aliás indicado Tesoureiro da nova obra, conhecia Irmã Rosalie, por ter sido
representante da rua Epée-de-Bois junto à religiosa, cuja acção caritativa enchia
toda Paris. Ela prodigalizou-lhe a melhor acolhida, encorajou a acção dos
jovens, orientou-os, entregando-lhes uma lista de famílias a visitar,
fornecendo também “vales” para carne e pão, visto que a Conferência ainda não
emitira os seus.
As Primeiras
Visitas
Escolhidas as famílias a
socorrer, cada “confrade”, pois foi esse o título que se deram, trataram de pôr
mãos à obra. Era de ver o entusiasmo com que se entregaram à tarefa, descobrindo
verdadeiro mundo novo de confraternização cristã. Em contacto com o sofrimento
e as misérias humanas, aqueles jovens passaram a compreender melhor o valor da
caridade bem ordenada e as palavras de Cristo fazendo do amor ao próximo um Novo
Mandamento.
A Ozanam coube assistir um
caso de miséria moral acima da material: uma infeliz mulher se matava no
trabalho para sustentar cinco filhos; seu companheiro, chegando em casa
embriagado, tomava-lhe o dinheiro e ainda batia nela e nos meninos. Ozanam
conseguiu separá-la, pois não eram casados, obteve meios para que ela voltasse
ao interior com dois filhos, empregando os demais nas oficinas de Bailly. Era a
assistência total, exemplo do futuro papel das Conferências.
Audiência com
o Papa Gregório XVI
Por iniciativa de seu pai,
Ozanam passou as férias de 1833 na Itália, medida prejudicial aos intentos da
família, que era vê-lo formado em Direito, enquanto a visita aos centros
culturais italianos mais aumentaria no jovem a atracção pela Literatura. O Papa
Gregório XVI recebeu João Antonio Ozanam e os dois filhos em audiência particular,
apresentados pelo Cardeal Fesch, Arcebispo de Milão. Ao regressar, Ozanam muito
sofreu, impedido de seguir sua vocação.
Dedicação ao
Curso de Direito em respeito aos pais
Voltando à França, os estudos
de Direito o aguardavam, juntamente com os exames para licenciatura como advogado.
Era um passo decisivo. Seu pai e sua mãe nem de longe queriam que ele se
formasse em Letras,
coisa sem futuro, diziam eles.
Por isso o jovem reafirmou, em carta à mãe, juramento de fidelidade ao Curso Jurídico.
Apenas pedia que permitissem a consolação de um pouco de literatura para, ao menos,
adoçar as amarguras da jurisprudência.
Diante desse juramento, Ozanam
empregava oito horas diárias, excepto aos domingos, no estudo do Direito. Ao mesmo
tempo frequentava cinco cursos da matéria, praticando ainda advocacia. Via
nisso uma loucura, pois sua vontade era escrever sobre outras coisas que não
assuntos forenses e não pensar em assuntos de cartório. Ainda dava graças a
Deus por lhe permitirem, com a advocacia, praticar a oratória, o que lhe facilitava
cultivar a literatura, “mãe da eloquência”.
Apesar de tudo, a escolha de
uma carreira o torturava. Ainda chegou a pensar em acumular a advocacia com a literatura.
Se pudesse preferir esta, faria o “apostolado das letras, pela pena e pelo
ensino. Aliás, de toda parte vinham confirmações a favor das letras, como
solicitações para artigos de jornais, reuniões intelectuais, conferências sobre
literatura. Não seria tudo isso manifestação da vontade de Deus? Mas a decisão
da família estava do outro lado.
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