A morte de Antônio
Frederico Ozanam
Verdadeira procissão
de amigos, confrades e humildes camponeses acompanhou-o até Livorno, onde
embarcou. Por onde passava recebia saudações que agradecia com triste sorriso.
Viajou no camarote, alegrando-se por ver as praias da Provença. Em Marselha,
recebido pela sogra e família da esposa, disse: “Agora, que restituo Amélia a
boas mãos, entrego-me a Deus, que fará de mim o que quiser”. Chegando em casa,
deitou-se para não mais se levantar.
A notícia de sua
chegada espalhou-se velozmente e logo a casa tornou-se centro de peregrinação:
sacerdotes, religiosos, confrades vicentinos procuravam contemplá-lo pela última
vez, o que se tornava impossível, dado seu doloroso estado. Só os membros da
família cercavam seu leito. Quase insensível ele parecia não sofrer muito. Uma
calma de morte sucedeu à anterior agitação. Era a calma de uma tarde serena que
antecede às noites felizes.
A morte se
avizinhava. Pediu os últimos sacramentos. Ao Padre afirmou: “Por que temeria a
Deus se o amo tanto?” Amanheceu o dia 8 de Setembro – Natividade de Nossa
Senhora – no quarto, a esposa, irmãos e parentes. No quarto vizinho, vicentinos,
ajoelhados, rezavam. Ele dormitava tranquilamente. De repente, abriu os olhos,
como fitando alguém, levantou as mãos e gritou: “MEU DEUS, MEU DEUS, TENDE
PIEDADE DE MIM!” Foram suas últimas palavras. Entrou em agonia.
Eram 8 horas da noite
quando morria António Frederico Ozanam, inspirador, fundador e propagador
incansável da Sociedade de São Vicente de Paulo; valente defensor da Igreja de
Cristo, dos humildes e injustiçados; amigo inseparável da verdade; sociólogo de
visão profética que advertiu com desassombro os governantes e os poderosos
contra os perigos da miséria e da opressão; aquele que consagrou a vida ao
sublime ideal do amor ao próximo por amor a Deus.
Morto Ozanam, três
cidades reclamavam a honra de servir-lhe de derradeira morada: Marselha, onde
falecera; Lião, onde morara com sua família e Paris, onde desenvolvem seu
apostolado. Em Lião havia o jazigo da família. Mas Amélia tornou claro que ele,
em vida, expressara o desejo de sepultar-se em Paris, no seio da juventude que
tanto amara e pela qual dera a vida. O Padre Noirot deu-lhe razão. E Paris
conseguiu a preferência.
O sepultamento de
Ozanam
Devendo o corpo ser embalsamado para suportar
a longa viagem até Paris, pediu a família aos médicos fosse constatada a causa
da doença que o matou, sendo verificado que o rim direito estava completamente
destruído por motivo de lenta inflamação. Mas, que motivou essa inflamação?
Teria sido câncer, doença então pouco estudada e conhecida? No tempo não havia
laboratórios especializado e muito menos raio X. Assim, não se ficou sabendo de
que morreu Ozanam.
Levado a Paris, o corpo foi depositado na
igreja de S. Sulpício, perante grande concorrência de estudantes, amigos,
professores e alunos da Sorbona, operários e centenas de vicentinos. Todos
manifestavam dor profunda. Celebrada Missa, colocaram o féretro numa capela
subterrânea da igreja, em carácter provisório. Pretendiam levá-lo para o
cemitério de Montparnasse, mas o Padre Lacordaire conseguiu transladá-lo para a
igreja S. José de Carmes, da sua Ordem.
Havia lei proibindo sepultamento nas igrejas.
Amélia, atendendo ao desejo de Ozanam, que queria ser enterrado numa igreja,
conseguiu com o Ministro dos cultos, amigo desde a juventude, permissão para
que o corpo lá ficasse, como se ele não soubesse. Amélia não pôde assistir à
inumação pois era dentro da clausura vedada às mulheres. Mais tarde, obteve de
Pio IX autorização para chegar até o túmulo passando pelo jardim do convento.
Extinta a lei proibindo o sepultamento nas
igrejas, Amélia deu ao túmulo a forma de catacumba romana, com inscrição em
latim mencionando trabalhos e méritos.de Ozanam, e, por último, Lacordaire apôs
as palavras do Anjo às Santas Mulheres: “POR QUE BUSCA.S ENTRE OS MORTOS AQUELE
QUE ESTÁ VIVO?” No centenário de Ozanam, os vicentinos do mundo inteiro
construíram na cripta um mausoléu de mármore com um altar defronte para
celebração de missas.
Desde a hora do seu sepultamento, constantes
hão sido as manifestações exultantes e serenas pela sua imortalidade no céu e
na terra. O Reitor da Faculdade de Letras de Paris repetia aos presentes as
palavras de Dante: “Não lhe choreis a morte, pois é a imortalidade que começa”.
Para Léonce Curnier, “a auréola da santidade que o cercava, quando vivo, nada
perdeu do seu brilho”. O Jesuíta Villefort sustentava estar ele na posse da
glória eterna.
A glorificação de Ozanam
Não foram somente os homens de letras,
professores universitários ou sacerdotes eminentes que destacaram a grandeza de
Ozanam. O Papa Pio IX, que o conheceu de perto, exaltava-lhe a figura de verdadeiro
cavaleiro de Cristo. Leão XIII apontou-o como modelo para seus concidadãos e
sobretudo modelo de religião e de boas obras. Pio X viu nele um dos mais
distinguidos campeões da ciência cristã. Qual o mortal que já recebeu tal
consagração?
A verdadeira glorificação de Ozanam
fundamenta-se na Sociedade de São Vicente de Paulo, “honra e glória dos tempos
atuais e humanamente inexplicável, porque é realmente obra de Deus” (Cardeal
Vanutelli). Bento XV aponta-a como extraordinária efusão do apostolado e ação
social, e Pio X, que a incluiu nas intenções do Apostolado da Oração, afirmava
que ficaria muito feliz se em cada paróquia do mundo existisse uma Conferência da
Sociedade de São Vicente de Paulo.
Com a morte, muitas glórias humanas, muitos
nomes considerados imortais, caem depressa no esquecimento. Mas, para Ozanam
bem se pode aplicar a exclamação de S. Paulo: “Ó morte, onde está a tua vitória?”
Desde o momento em que o seu corpo foi recebido carinhosamente pela irmã terra,
começaram a reboar no silêncio do seu túmulo as palavras do anjo: “Não deve ser
procurado entre os mortos aquele que está vivo”.
Na verdade, Ozanam continua sempre vivo. A
semente lançada em Paris,em 1833 tornou-se árvore que estendeu seus galhos por
toda a terra, “dando sombra e consolo aos que padecem”, Como disse o Cardeal
Verdier, a Sociedade de São Vicente de Paulo abriu para a humanidade uma era
nova com seu aposto lado leigo, de formas numerosas e múltiplas, que será hoje
e será amanhã a mais bela esperança da Igreja em todo o universo. Obra de
assistência mas também de santidade.
A beatificação de
Ozanam
Pela sua vida
intemerata, pela sua acção apostólica, pelo seu devotamento à causa da Igreja,
Ozanam pode ser considerado um Santo de nossos dias. Desde 1925 a causa de sua
beatificação foi introduzida na Santa Sé. E desde então os confrades vicentinos
do mundo inteiro recitaram a oração composta pelo Cardeal Amet, implorando a
Deus possa ele merecer as honras dos altares.
E ouvidas as preces,
a sua Santidade o Papa João Paulo II, testemunhou com uma bela homilia, durante
a missa de beatificação de António Frederico Ozanam no dia 22 de agosto de
1997, a importância da Sociedade de São Vicente de Paulo e de seu fundador.
Desde então, os
vicentinos de todo o mundo esperam confiantemente a canonização do Beato António
Frederico Ozanam, cuja protecção evidente à Sociedade de São Vicente de Paulo, a
tem feito sobreviver, de modo inexplicável pelos meios temporais mas
compreensível pelo seu valimento junto à Divina Providência.
Que a vida luminosa
de Ozanam, aqui retratada de modo resumido, sirva, a todos os que a lerem, de
estímulo aos que vivem o ideal da caridade evangélica e de atração aos que dele
estão afastados.
FIM
by Javier F. Chento - http://www.vicentinos.info/vida-de-ozanam-i/
Sem comentários:
Enviar um comentário