«Somos chamados ao trabalho desde a nossa criação. Ajudar "pessoas em situação de pobreza", deve ser sempre um remédio provisório. O verdadeiro objectivo deveria ser sempre consentir-lhes uma vida digna através do trabalho» Laudato Si: página 88.

quarta-feira, 28 de dezembro de 2016

Carta de Ozanam - 6 - A Ernesto Falconnet

Lião, 24 de Agosto 1830

   A carta que adiante se insere revela.nos, na sua primeira parte, uma faceta do temperamento de Ozanam porventura menos conhecida: o seu sentido de humor.

   Ozanam, então com 17 anos, exprime-se nas primeiras linhas desse documento como um jovem descontraído e folgazão, que brinca amigavelmente com um seu parente e companheiro de  trabalho, dois anos mais novo: Ernesto Falconnet. (1)
   Dada a diferença de idades, Ozanam sente-se à vontade para aludir ao «ilustríssimo espírito» e ao «génio criador» do «muito alto e muito poderoso senhor» seu amigo à sua boa ou má disposição, à vantagem, à vantagem de se iniciar na investigação filosófica. E receita-lhe «coragem» para enfrentar os desafios da vida.

   Mas os ditos espírito logo dão lugar a um estilo mais sério. Mostrando-se indeciso quando à carreira que terá a percorrer, o nosso Fundador refere: «quis ser advogado e sempre tive a intenção de cultivar as letras e a filosofia». E, efectivamente, dez mais tarde, ele já teria cumprido o seu doutoramento em Direito e em Letras; e ascenderia à situação de professor universitário. 

   Ao mesmo tempo, transparente da carta a atracção por assuntos pertinentes à história literária, por temas diversos sobre a Antiguidade e até - pasme-se! - pela aquisição de  «alguns conhecimentos preliminares sobre a sânscrito». 
   No meio deste enciclopedismo, desta insaciável apetência pelos saberes, a confessada incerteza sobre o rumo a dar à sua vida. Isto em razão doas vicissitudes próprias dos tempos que decorriam e também pelo clima de guerra existente, que não propiciava tranquilidade de espírito nem um planeamento calma do futuro.
   É de notar que Ozanam não repudia as contingências da condição militar - longe disso. Mas procura sublimá-las através do tempero da filosofia, da poesia, da própria religião. Esta «utopia» de Ozanam, acerca do desempenho das obrigações militares contém, observações cheias de interesse, reveladoras da forma como ele projectava todos os problemas e acontecimentos da sua vida num amplo quadro de referência, de matiz religiosa e cultural.
   No final, Ozanam dirige ao seu amigo palavras de incitamento, no sentido da continuação do trabalho comum que ambos tinham entre mãos. 

   Em suma, trata-se de uma carta que, sem conter revelações sensacionais, deixa entrever alguns dados muito elucidativos sobre o carácter do jovem Ozanam, bem como sobre as suas preocupações espirituais e culturais.

(1) Esnesto Falconnet, nascido em 1815 e falecido em 1891, foi um magistrado e homem de letras com alguma notoriedade na sua época.

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