Conde de Aljezur, fundador da SSVP no Brasil e em Portugal
A formidável história de vida do Conde de Aljezur e a importância dele para
a SSVP do Brasil e de Portugal
Confrade Renato Lima (*)
Na caminhada vicentina, jamais podemos
nos esquecer do legado deixado pelos fundadores da Sociedade de São Vicente de
Paulo (SSVP). Em 1833, em Paris (França), aqueles pioneiros – Ozanam, Bailly,
Clavé, Devaux, Le Taillandier, Lallier e Lamache – receberam a inspiração
divina de fundar essa obra maravilhosa, que vem produzindo incontáveis frutos
de caridade, de conversão e de evangelização pelo mundo, até aos nossos dias.
Da mesma maneira, nos diversos países,
devemos sempre fazer um resgate histórico, buscando identificar os primórdios
da SSVP. No caso do Brasil e de Portugal, uma figura humana se sobressai:
Francisco de Lemos de Faria Pereira Coutinho, mais conhecido como Conde de
Aljezur. Vamos conhecer um pouco da história desse importante confrade, responsável
pela fundação da Sociedade no Brasil e em Portugal. Um homem escolhido por Deus
para espalhar o carisma vicentino em terras lusitanas e brasileiras.
Francisco Coutinho nasceu em 12 de
setembro de 1820, na cidade do Rio de Janeiro (Brasil). Àquela altura, o país
ainda não era uma nação independente (o que só aconteceria em 7 de setembro de
1822), e, portanto, Francisco Coutinho era cidadão português, nascido na então
colônia Brasil. No dia 3 de junho de 1845, em Portugal, com 25 anos de idade,
ele se casou com Maria Rita de Noronha (ela nascera na cidade de Tavira, em
Portugal, em 21 de janeiro de 1826). O casal não teve filhos.
Em 15 de setembro de 1858, por meio de
decreto, o rei de Portugal, Dom Pedro V, concedeu o título de Viscondessa de
Aljezur à senhora Maria Rita, e na mesma data, estendeu o título a Francisco
Coutinho, que adotou a designação de Visconde de Aljezur. No Brasil, o
imperador Dom Pedro II confirmou o título de visconde a Coutinho, por meio de
portaria de 23 de dezembro de 1858. Mais tarde, em 10 de abril de 1878,
Francisco Coutinho teve o título de visconde elevado à categoria de conde, em
ambos os países. Como se percebe, ele detinha os mesmos títulos de nobreza,
tanto em Portugal como no Brasil.
Na concessão de títulos, os reis e
imperadores escolhem nomes aleatórios, geralmente vilas, cidades ou acidentes
geográficos (como lagos, rios, montanhas, vales e serras). Assim, a palavra
“Aljezur” em Portugal tem duas origens: é uma pequena vila, na região do
Algarve, atualmente com 6.000 habitantes; e é também nome de um rio (ou
ribeira) que nasce na Serra de Monchique e deságua no Oceano Atlântico, na bela
Praia da Amoreira. Dom Pedro V escolheu “Viscondessa de Aljezur” (para Dona
Maria) e “Visconde de Aljezur” (para Francisco Coutinho) por mera liberalidade,
sem nenhuma razão específica. “Aljezur” é uma palavra de origem árabe e
significa “ilhas” (al jazair). “Al jazira” é o singular (“a ilha”). Em
espanhol, “aljezur” pode ser traduzido como “Algeciras”. Do mesmo radical,
surgiu a palavra Argélia.
Francisco Coutinho era funcionário da
Coroa e servia ao Império do Brasil, desempenhando inúmeras funções, encargos e
missões. Ele comandou, por exemplo, o 7º Corpo de Cavalaria da então Província
do Rio de Janeiro, sediada na Vila de Iguaçu, região que hoje conhecemos como
município de Nova Iguaçu. Ele também foi fidalgo de Dona Maria Leopoldina
(Imperatriz do Brasil, a primeira esposa de Dom Pedro I), responsável contábil
de Dona Amélia Augusta Eugênia Napoleona de Beauharnais (Imperatriz do Brasil,
a segunda esposa de Dom Pedro I), e assessor direto do imperador Pedro II,
chegando a acompanhá-lo até no exílio em Portugal, após a proclamação da
República (em 15 de novembro de 1889). Coutinho foi companheiro inseparável de
Dom Pedro II, sendo-lhe leal até a morte do monarca, em 1891. Depois, regressou
ao Brasil e foi viver em Petrópolis, onde já havia se estabelecido durante o
reinado de sua majestade imperial, Dom Pedro II.
No aspecto vicentino, Francisco Coutinho
foi um dos fundadores (e 1º Vice-presidente) da Conferência “São Luís Rei de
França”, da Igreja de São Luís dos Franceses, em Lisboa (Portugal), fundada em
31 de outubro de 1859, juntamente com o padre Joaquim José Sena de Freitas
(CM), padre Emílio Eugênio Miel (CM), Conde de Samodães e outros. Ele também
colaborou com o confrade francês M. Thiberge na fundação da Conferência “São
Pedro”, a segunda em terras portuguesas, no Funchal (Madeira), em 1875.
Francisco foi vice-presidente do Conselho Superior de Portugal, tendo ação de
grande relevância.
No Brasil, juntamente com outros
confrades (Pedro Fortes Marcondes Jobim, secretário, e Antônio Secioso Moreira
de Sá, tesoureiro), fundou, em 4 de agosto de 1872, a Conferência “São José”,
sendo o Visconde de Aljezur eleito o primeiro presidente de uma Conferência
Vicentina em terras brasileiras. Vale ressaltar que, no momento da fundação da
Conferência “São José”, o confrade Francisco de Lemos de Faria Pereira Coutinho
detinha o título de “visconde” (pois o grau de conde só lhe fora concedido em
1878, como já mencionado).
Após a morte de Dona Maria Rita,
Francisco Coutinho contraiu novas núpcias, desta vez com Ana Carolina de
Saldanha da Gama, nascida em 1º de agosto de 1834, no Rio de Janeiro. O casal
não deixou descendentes. Francisco Coutinho possuía, também, inúmeras comendas,
como a Ordem Sueca da Estrela Polar, Ordem de Cristo (no Brasil) e Ordem de São
Gregório (na Itália). Uma curiosidade: em 12 de agosto de 1903, foi inaugurada
a Estação Aljezur, em Nova Iguaçu (RJ), integrante da Linha Auxiliar da Estrada
de Ferro Central do Brasil, em homenagem ao conde que possuía terras naquela
localidade. Lamentavelmente, a Estação Aljezur encontra-se, desde 1996,
abandonada, ocasião em que a referida linha férrea foi desativada.
O Conde de Aljezur, homem brilhante de
dois continentes (América e Europa) e de duas nações irmãs (Brasil e Portugal),
faleceu em 2 de abril de 1909, em Petrópolis, Estado do Rio de Janeiro
(Brasil), aos 99 anos de vida. Empregou toda a sua existência no exercício da
caridade cristã. Peçamos a Deus pela alma deste memorável confrade, que fundou
a SSVP em Portugal e no Brasil. Só podemos projetar o futuro se conhecermos o
passado e se soubermos valorizar os nossos antepassados, desbravadores da
história, que abriram as portas para a existência da Sociedade de São Vicente
de Paulo pelo mundo. Que a memória, vida e biografia do confrade Francisco
Coutinho seja amplamente difundida no seio da SSVP e da Família Vicentina!
(*) Renato Lima de Oliveira é o 16º Presidente Geral da SSVP (2016/2022).
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