O nascimento da filha
torna a vida de Ozanam ainda mais feliz
Adquirida a
estabilidade profissional, assegurada uma situação económica folgada, Ozanam
consolidou a família em seu redor. Os dois irmãos passaram a residir com ele e
até sua velha ama, Guigui, veio para sua companhia. Ele dizia ter transportado
para Paris as paredes paternas com os móveis e tudo. Por fim também vieram
sogro e cunhado. Ozanam, entretanto, ainda esperava alguém. Em agosto de 1845
sentia uma das maiores alegrias de sua vida: era Pai.
A disposição com que
Ozanam recebeu a filha traduz bem seu procedimento de pai cristão: “Eu vi esta criaturinha,
mas criatura imortal, posta por Deus em minhas mãos. Que trazia doçuras mas
também obrigações. Distinguia nessa doce figura, plena de inocência, o selo
sagrado do Criador. E compenetrava-me de que teria de prestar contas dessa alma
imperecível, posta por Deus em minha vida, como um meio amável para me colocar no
caminho do Céu”.
Pai e mãe sorriam com
os primeiros sorrisos da criança e com impaciência aguardavam seu baptismo.
Recebeu o nome de Maria, em lembrança da avó e “gratidão à celeste patrona” a
quem atribuía o nascimento. O padrinho foi Lallier. Ozanam via na filha um
presente do Céu para fazer os pais melhores. Com o tempo dizia nada haver de
mais doce do que, chegando em casa encontrar a amada esposa com a filhinha nos
braços.
Foram dos mais
felizes os anos de 1844 a 1846, decorridos na paz da família e nas ocupações
dos estudos. No lar, Ozanam procedia como esposo amante e pai carinhoso. Na
sobriedade de sua mesa não faltava aos domingos um prato saboroso. Todos os
meses, na data do casamento, oferecia um presente à esposa. E Amélia executava
ao piano os grandes mestres que ele muito apreciava. Em 1846 foi nomeado
Cavaleiro da Legião de Honra.
Ozanam recusa o cargo
de vice-presidente do Conselho Geral
Nem o lar nem as
aulas afastavam-no da Sociedade de São Vicente de Paulo. Bailly deixara a
Presidência para evitar perpetuidade. Após oito dias de orações ao Espírito
Santo, o Conselho Geral deveria escolher o sucessor.
Elegeram Ozanam,
então Vice-Presidente. Ele recusou, indicando Gossin, Conselheiro do Tribunal
Real e Presidente da Conferência de S. Sulpício, que lhe pediu continuasse na
Vice-Presidência. Concordou. Preferiu o trabalho obscuro, num devotamento
contínuo aos interesses da sua “querida Sociedade”.
Ozanam fica enfermo e sofre por não poder visitar os
pobres
A
resistência física de Ozanam chegara ao máximo. Suas forças não suportaram o
excesso de trabalho. Em agosto de 1846 caiu gravemente doente. Uma febre
perniciosa o prostrou com perigo de vida. E, como ele mesmo afirmaria depois,
não fossem os cuidados do Dr. Gourand e a ternura inteligente e corajosa de
Amélia, poderia ter morrido. Após um mês de convalescença não conseguia nem
levantar-se. A fraqueza era total. Trabalhar era mesmo impossível.
Apesar
de todos os esforços médicos a doença persistia indomável. Tentaram passeios no
campo, em vão. Sofria mais por não poder visitar seus pobres, e, para
consolar-se, mandava distribuir pão aos que lhe batiam à porta. Também não
podia prosseguir nas aulas. Os médicos determinaram um ano de repouso absoluto.
O Ministro da Instrução, seu admirador, incumbiu-o de estudos e pesquisas
históricas na Itália. Desejava, porém, é que ele se tratasse. Ozanam aceitaria
isso?
A recuperação de Ozanam e seu encontro com o papa Pio IX
Felizmente
a mudança de ares foi o melhor remédio e Ozanam pôde, sem constrangimento,
desempenhar a comissão estipulada pelo Ministro. Sentia-se renascer gozando a
viagem e frequentando os museus e arquivos históricos tendo ainda a alegrar-lhe
a existência a companhia da esposa estremecida e da filhinha querida. Ele iria
empolgar-se com a agitação que invadira a Itália e o arrastaria para a luta noutros
importantes sectores dos sofrimentos humanos.
Chegando
a Roma, Ozanam procurou em primeiro lugar ver o Papa Pio IX, eleito em Junho de
1846. E ficou deslumbrado com as manifestações que lhe prestava o povo, que,
apinhado aos milhares, o aclamava e dele recebia em pessoa a comunhão. Com
lágrimas nos olhos, contemplava aquela figura “tão doce, tão santa”, exprimindo
tanta caridade. E dizia para si que “era conquistando corações que o Papa
conquistaria todos para Igreja”.
O
Santo Padre recebeu Ozanam em audiência particular, que ele assim descreve:
“Sua Santidade fez minha mulher sentar-se e abençoou minha filhinha de dezoito
meses que, ajoelhada, olhava para ele. O Santo Padre falou da França, da
juventude, das escolas, com muita emoção”. “Disse que conhecia a Sociedade de
São Vicente de Paulo e as boas obras que sua juventude praticava com as visitas
aos pobres e doentes, concluindo: Nossa esperança está nessa mocidade”.
Em agosto de 1847,
Ozanam regressou recuperado, mas empolgado pelos novos rumos que Pio IX dera ao
seu governo espiritual e ao seu reinado temporal. O Papa provocara revolução política
nos Estados Pontifícios. Concedera amnistia, determinara a revisão das leis
vigentes, criara o Conselho de Estado e estabelecera uma representação comunal.
Ozanam presenciara a “marcha triunfal” da multidão, dando vivas a Pio IX. Desde
então quis defender também as necessidades políticas e sociais do povo.
Ozanam volta às aulas na Sorbona
Em Dezembro, após
um ano de ausência voltou Ozanam às aulas, na Sorbona. Deveria apreciar o
“Purgatório”, de Dante, poeta do Cristianismo e da liberdade na Itália. O
assunto prestava-se a aplicar, na exposição, o que ele apreciara na Cidade
Eterna, nas manifestações populares a Pio IX. E ele dizia ter visto o começo de
uma Nova Era, “a sociedade abraçando a liberdade, só possível abençoada pelo
Cristianismo”. Ozanam firmava suas convicções sobre Doutrina Social.
Ele estava dominado
pela necessidade da mudança do sistema político reinante na Europa, e por isso
louvava Pio IX, por “se ter passado aos bárbaros” repetindo o gesto dos grandes
Papas da Idade Média, apoiando os chamados “bárbaros” contra os prepotentes
senhores feudais. Assim a Igreja salvou toda a Europa. Agora, as massas
populares – os bárbaros de hoje – querem participar do Governo. Foi o que fez
Pio IX, abrindo ao povo o lugar no poder.
Certos meios
católicos não aprovaram as atitudes de Ozanam “exagerando os erros dos
conservadores e atenuando os dos revolucionários”. Nesse ínterim, rebentou a
revolução republicana na França, com seu cortejo de desordens e destruição.
Embora declarando-se contrário à violência e ao saque, Ozanam via no movimento um
passo para a Democracia, com muita possibilidade para o reconhecimento dos
direitos da Igreja, desde que não se condenasse a vontade do povo, desejoso de
liberdade.
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