Antignano, 19 de Julho de 1853
Meu Reverendo Padre e querido Amigo
É preciso que, de futuro,
permitais que vos atribua estes dois títulos. Por um lado, não posso abstrair
do respeito que toda a Itália vos dedica e de que vos vi rodeado nesta boa
cidade de Siena. Ao mesmo tempo, como não sentiria a mais doce amizade, o mais
vivo reconhecimento por todas as bondades de que acabais de cumular-me, bem
como aos meus? Como fazeis? Que largueza de coração, que presença
de espírito Deus vos concedeu e qual é o vosso segredo para
multiplicar o tempo? Tendes o triplo encargo dos surdos-mudos de toda a
Toscana, de uma das maiores escolas italianas, o colégio Tolomei, de uma
cadeira na Universidade: sois o Padre de Siena e não há um canto de rua, uma
porta, onde não tenhamos encontrado algum dos vossos protegidos. Enfim,
ocupai-vos de toda a gente e no entanto eis que chegamos, cinco estrangeiros
caem sobre vós e durante quatro dias apenas viveis para nós; sois a nossa
providência. Formamos um cortejo lastimoso; trazemos connosco mulher, doente,
criança; cada um encontra aquilo de que precisa perfeitamente previsto e
preparado: alojamento, alimentação, distracção, edificação, a parte da alma, a
parte do corpo, o necessário e o agradável. Enfim, apenas temos que nos deixar
viver nesta bem-aventurada Siena, onde se narra que tantos santos foram
servidos pelos anjos. Nós não somos santos; mas, por certo, um bom anjo nos
serviu. Finalmente, partimos carregados de presentes e de lembranças: eu, com o
vosso belo Elogio de novo publicado e o vosso volume da Língua lombarda e
sobretudo o vosso retrato: Amélia, com Santa Catarina e a pequena Maria com
tantas coisas que mais valeria transportar o Palácio da comuna.
Pois bem, meu reverendo
Padre, tudo que fizeste pela minha pequena família e por mim próprio
sensibiliza-me menos do que a esperança que me destes em relação a S. Vicente
de Paulo. Esta querida Sociedade é também a minha família. Foi ela, depois de
Deus, que me conservou na fé, quando deixei os meus bons e piedosos pais. Amo-a
e estou-lhe ligado pelo mais profundo do coração: fiquei radiante por ver a boa
semente germinar nesta terra da Toscana.
Mas, sobretudo, vi-a fazer
tanto bem, sustentar na virtude um tão grande número de jovens, acender num
mais pequeno número um zelo tão maravilhoso! Temos conferências em Québec e no
México. Temo-las em Jerusalém. Temos também, seguramente, uma conferência no
paraíso, pois mais de um milhar dos nossos, durante estes vinte anos da nossa
existência, tomaram o caminho de uma vida melhor. Portanto como deixar de ter
uma conferência em Siena, a que se chamava a ante-câmara do paraíso? Na cidade
da Virgem santa, como não veríamos o êxito de uma obra que tem a Virgem santa
como principal padroeira? E, sobretudo, como não teríamos êxito no colégio Tolomei,
onde nossa jovem iniciativa crescerá sob a vossa mão, discretamente, sem os
inconvenientes de uma publicidade precoce?
Tendes crianças ricas, Oh,
meu padre, a lição útil para fortificar estes corações amolecidos será o
benéfico espetáculo de lhes mostrar os pobres, de lhes mostrar Nosso Senhor
Jesus Cristo não somente nas imagens pintadas pelos grandes mestres, ou sobre
altares brilhantes de ouro e de luz, mas mostrar-lhes Jesus Cristo e as suas
chagas na pessoa dos pobres. Muitas vezes falamos da fraqueza, da frivolidade,
da nulidade dos homens, mesmo cristão, na nobreza de França e da Itália. Mas
estou certo de que eles são assim porque uma coisa faltou à sua educação; há
uma coisa que não lhes foi ensinada, uma coisa que apenas conhecem de nome e
que é preciso ter visto suportar aos outros, para aprender a sofrê-la quando
ela vier, cedo ou tarde. Esta coisa é a dor, é a privação, é a necessidade. É
preciso que estes jovens senhores saibam o que é a fome, a sede, a indigência
de umas águas-furtadas. É preciso que ele vejam miseráveis, crianças doentes,
crianças a chorar. É preciso que as vejam e que as amem. Ou este quadro
provocará algum sobressalto no seu coração, ou esta geração está perdida. Mas
nunca se deve acreditar na morte de uma jovem alma cristã. Ela não está morta,
mas dorme.
Meu caro e respeitável amigo, envio-vos com o Boletim da sociedade de S.
Vicente de Paulo uma excelente instrução sobre a formação das conferências nas
casas de educação. Certamente, a vossa experiência não tem necessidade de ser
esclarecida e podereis adaptar o nosso pequeno trabalho à vossa grande casa,
sem deixar de nos estar unido e de fazer lucrar aos vossos alunos as ricas
indulgências concedidas à Sociedade de S. Vicente de Paulo. Em breve os vossos
melhores jovens, divididos em pequenas esquadras de três ou quatro acompanhados
de um professor, irão subir a escada do indigente; vê-lo-eis regressar ao mesmo
tempo tristes e felizes; tristes por causa de mal que terão visto, felizes por
algum bem que terão praticado. Alguns irão conduzir-se talvez friamente, sem
inteligência; mas outros hão-se exaltar-se com um entusiasmo que transportarão às
cidades onde não existem conferências, ou então irão reanimar as conferências
mais antigas de Florença, de Génova, de Milão, de Roma; e de todas as suas boas
ações, uma parte virá acrescentar-se à coroa de Deus prepara para o Padre
Pendola, mas que Ele concederá, assim o espero, o mais tarde possível.
Apercebo-me de que renovo o provérbio francês: «Gros-Jean veut prêcher
son curé» (1). Não, meu
Padre, não estou a pregar-vos; é o vosso exemplo, é a vossa caridade que me prega,
que me aconselha a ter confiança em vós e a colocar esta obra nas vossas mãos.
( (1) Big John quer que o seu pastor pregar.
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